O uso do glifosato na União Europeia: de que consenso estão falando?

A reportagem da DW relata a decisão da Comissão Europeia de prorrogar por mais dez anos a licença para o uso do glifosato na União Europeia. A decisão foi tomada devido à falta de um consenso entre os 27 países do bloco sobre a extensão da licença ou a proibição do agrotóxico mais utilizado no mundo, cuja aplicação é alvo de polêmicas e intensos debates entre especialistas e ambientalistas.

O glifosato é um herbicida sistêmico de amplo espectro, o que significa que ele é absorvido pelas plantas e circula por todo o seu corpo, matando-as. O produto é usado principalmente na agricultura, para controlar o crescimento de ervas daninhas que competem com as culturas.

Os efeitos do glifosato na saúde humana e no meio ambiente são controversos. A Agência Internacional de Pesquisa em Câncer (IARC), órgão da Organização Mundial da Saúde (OMS), classificou o glifosato como <<provavelmente cancerígeno para humanos>>. No entanto, a Autoridade Europeia para a Segurança Alimentar (EFSA) concluiu que o produto não representa um risco significativo para a saúde humana.

A decisão da Comissão Europeia foi criticada por ambientalistas e especialistas, que argumentam que o glifosato é um produto perigoso que pode causar câncer, danos ao sistema nervoso e ao meio ambiente.

A prorrogação da licença para o uso do glifosato na União Europeia terá impacto significativo no mercado mundial de agrotóxicos. A decisão da UE é um sinal de que os países desenvolvidos ainda estão divididos sobre a segurança do glifosato, o que pode dificultar a adoção de medidas mais restritivas sobre o produto em outras partes do mundo.

O glifosato é um composto organofosforado que inibe a enzima EPSP sintase. Esta enzima é essencial para a produção de aminoácidos, que são blocos de construção das proteínas. Quando a EPSP sintase é bloqueada, as plantas não conseguem produzir proteínas e morrem. Quando absorvido pelas plantas através das folhas e caules, o produto é então transportado para todas as partes da planta, incluindo as raízes. O glifosato é um herbicida sistêmico, o que significa que ele mata as plantas por dentro.  Trata-se um produto relativamente barato e fácil de usar. É por isso que ele é tão popular entre os agricultores. No entanto, o uso do glifosato também tem sido associado a uma série de problemas ambientais e de saúde. Para saber mais sobre o uso e mecanismos de ação do glifosato, recomendo a leitura do documento <<Herbicidas: mecanismos de ação e uso>> da Embrapa. 

O que mais chama a atenção nessa história toda é o critério: o consenso. Parece-me estranho que uma decisão técnica esteja sujeita/submetida a um fator não técnico, a saber, um consenso. Ora, se o caso é falta de <<consenso técnico>>, certamente está em razão do uso de metodologias díspares e nesse caso seria mister que se uniformizasse a metodologia de pesquisa. Mas se ambas as partes (defensores e antagonistas do glifosato) se recusam a uniformizarem a metodologia de análise, fica patente que o tal <<consenso>> jamais ocorrerá. 

A falta de consenso nesse caso privilegiou os defensores do glifosato, mas também poderia ter privilegiado seus antagonistas. O que fica evidente, portanto, é que questões alheias às científicas promoveram a falta de consenso e conferiram à mesma seu valor no debate. Que fique claro: uma pesquisa pode ser inconclusiva, mas isso é diferente de dizer que não há consenso sobre seu resultado, pois o consenso nada tem a ver com a inconclusividade da pesquisa. 

Percebam: podemos dizer não haver consenso sobre a apropriação/uso que se faz dos resultados científicos, os quais podem ser inconclusivos, e isso não seria um problema; mas se dissermos que os resultados estão sob suspeita, estaremos falando da validade ou não de uma pesquisa e consequentemente de seus resultados, os quais podem ser conclusivos ou inconclusivos. Resultados conclusivos só têm validade quando a metodologia pelos quais foram obtidos foi validada, o mesmo vale para resultados inconclusivos. 


Moacir Gabriel




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